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O que há de novo
Autor: Pedro Paulo Paulino
Atuante tanto na literatura de cordel quanto na poesia erudita, com diversas conquistas em prêmios literários de âmbito nacional. Além de seu trabalho como escritor, ele também é redator e diagramador de jornais, revistas e livros, atuando dentro e fora de Canindé. Como radialista, Pedro Paulo apresenta um programa aos domingos, focado em resgatar sucessos da Velha Guarda.
Durante a alta estação da romaria em Canindé, no mês de outubro, há um clichê tão repetido, que é como se fosse um comando gravado no cérebro e acionado automaticamente. Só os nativos entendem. Trata-se do “depois da festa” – uma frase curta, mas de enorme efeito, que implicitamente e de caráter recíproco é acatada e compreendida por todos. Aquele compromisso, aquele projeto, aquela incumbência antes impreterível, aquela promessa de algo, ficam agora reservados para… depois da festa. O passeio fora da cidade, a compra de um objeto, o filme inédito, o encontro rotineiro que põe em dia a fofoca…
Rubem Braga, mago da crônica brasileira, tem uma que se chama “Um pé de milho”, que aliás virou título de livro. Texto enxuto e saboroso como o próprio milho em todas as suas performances, da espiga cozida ou assada à pamonha. Palavras líricas com cheiro de milho verde e a magia de uma boneca de milho agarrada ao caule, os cabelos loiros atiçados ao vento. No meu caso, admirável Braga, permita-me falar qualquer coisa sobre um pé de algodão, tão misantropo quão seu pé de milho urbano. Avistei-o à beira do asfalto, sob o céu límpido e ensolarado de setembro,…
Escrever nunca foi tão prático como hoje em dia, depois do advento da era digital. Eu disse prático, e não fácil, bem entendido. Pois escrever, de alguma forma, ainda é um desafio não rara vez angustiante para nossa cuca. No começo da década de noventa do século passado, quando a velha máquina de escrever ainda era a vedete das redações de jornal, Rachel de Queiroz, em crônica memorável, desabafa: “Ontem, num programa da TV, discutíamos entre escritores e jornalistas o drama do papel em branco na máquina e, diante dele, o pobre de nós, obrigado a espremer o juízo até…
O lugar se chama Paudarcal. O nome vem de longe, quando ali reinava em abundância os pés de ipê, também conhecido como pau d’arco. Fica no interior do município de Madalena. Há naquela terra uma tradição arraigada e conservada por família durante mais de quatro décadas. A farinhada no mês de julho provoca o ajuntamento de muita gente que distribui entre si diversas tarefas. O agricultor Gerardo Muquila, nome de guerra de Gerardo Gomes da Silva, é quem capitaneia, a cada ano que passa, mais uma edição da farinhada em sua propriedade. Tradição telúrica que vem de seu pai. A…
O meu primeiro brado pessoal de independência aconteceu durante o curso primário. Estudante procedente do meio rural, no ano de minha estreia em uma escola da cidade, deparei-me, no segundo semestre de aula, com uma experiência que para mim foi insólita e traumática: a participação obrigatória de um desfile estudantil no 7 de Setembro. Meu desconforto diante dessa nova situação começou com os treinos diários. Em detrimento disso, aulas eram sacrificadas, e, sob as ordens do orientador, saíamos em formação desfilando nas ruas, debaixo de um sol impiedoso. No primeiro ensaio, voltei para casa desapontado, e não escondi meu protesto.…
Em tempos de campanha eleitoral, vale a pena, mais do que nunca, relembrar a saga do candidato Formiga. Para começo de conversa, o processo eleitoreiro nos cafundós do sertão tem características bem diferenciadas do que acontece nos nichos urbanos, em tempo de eleição. O voto do eleitor matuto ainda é disputado dentro de padrões meio anacrônicos, naquela base da dinâmica do compadrio, da camaradagem e da visita acalorada do candidato, que uma vez eleito, sacode o pó das alpercatas e passa quatro anos em profunda e silenciosa ausência. O anúncio da vinda de algum candidato ao grotão mais remoto enche…
A vida do apresentador de televisão Silvio Santos foi toda um espetáculo. O pai nasceu na Grécia, a mãe na Turquia, e ele no Rio de Janeiro. Certa vez na infância, com sintomas de gripe, foi impedido pela mãe de ir ao cinema. Chateado, insistiu. A mãe disse não, e pronto. Durante a sessão, o cinema pegou fogo, deixando muitos feridos. Camelô de rua, ele já era um espetáculo, vendendo capas para título de eleitor, dizendo que cada unidade era a última do estoque. Em um concurso de rádio, tirou o primeiro lugar como locutor. Mas preferiu voltar ao comércio…
Bronze, prata, ouro? Nem uma das três. No verdadeiro campo de disputa e batalha de milhões de brasileiros, não há troféus nem medalhas. As olimpíadas são diárias o ano todo. Mas não há pódio. Não há bronze, prata nem ouro. As modalidades são incontáveis, num ritmo de competição quase selvagem. São atletas incansáveis nos estádios e pistas do embate sem trégua pela subsistência. Do catador de lixo ao gari, da faxineira ao caminhoneiro, o jogo da vida é uma constante matemática obrigatória, independente de inverno e verão, outono e primavera. São atletas sem a menor visibilidade, exceto em ano de…
Como se tivesse sido ontem, olho o calendário na parede e vejo que é primeiro de janeiro. Hoje, olho o mesmo calendário lá no seu canto e vejo que já estamos em agosto. Ao passo em que se apresenta o oitavo mês do ano, ainda parece-me respirar a atmosfera do Natal passado e ouvir os estampidos do Revéillon. A euforia do Carnaval também me parece que foi ontem. E assim, não é à toa que uma das interjeições mais repetidas por todos nós, com assaz frequência, é: como o tempo está passando rápido! Empregamos o verbo no gerúndio, com a…
Em 25 de julho, festejam-se o dia do Escritor, dia do Motorista e dia do Trabalhador Rural. Talvez não seja por mero acaso que a tríplice efeméride acontece na mesma data. Entre o motorista e o escritor nota-se forte afinidade. De modo que, quem maneja a pena, como quem conduz a direção precisa, sempre, de muito tento, conhecimento da estrada e domínio sobre as regras da profissão. No trânsito tumultuado sempre, muita vez o bom motorista tem que dirigir por si e pelos outros. Com o bom escritor é semelhante a situação. No vasto e promíscuo oceano de publicações virtuais…