No comecinho de março, o mês dedicado às mulheres, uma tragédia abalou todo o estado do Ceará e por onde quer que a notícia tenha se espalhado. Na manhã do dia três, cinco dias antes do Dia Internacional da Mulher, a jovem vereadora e presidente da Câmara Municipal de Juazeiro do Norte, Yanny Brena, de apenas 26 anos, foi encontrada morta em sua residência, ao lado do corpo de seu namorado (cujo nome prefiro omitir), de apenas 27 anos. O fato, naturalmente, chocou a cidade e toda a região caririense. Passada já uma semana, a investigação policial confirma que foi um caso de feminicídio seguido de suicídio.
A palavra feminicídio começou a se massificar não faz muito tempo, mais precisamente em 2015, quando entrou em vigor a Lei do Feminicídio, além de outras leis anteriores de combate à violência contra mulheres. O termo, por sua vez, vem da palavra femicídio, “cunhado em 1976 pela socióloga sul-africana Diana Russell, que sentiu a necessidade de diferenciar o homicídio de mulheres em razão do gênero”.
Em ambos os casos, a palavra traduz um acontecimento nefasto, em que a vida de mulheres de todas as idades é colocada em risco, em muitos casos fatal. A violência contra elas ocorre de variada forma, da agressão psicológica à agressão física e abuso sexual, do espancamento à morte; sem falar que, nestes tempos de tanta modernidade, há denúncias frequentes de violência digital a mulheres.
Outra palavra ligada à luta das mulheres por sua emancipação é “empoderamento”, que começou a se massificar nesta segunda década do novo século. São neologismos que, psicologicamente, sugerem o quanto a mulher, a despeito de todas as lutas e conquistas, ainda é discriminada no seio da sociedade milenarmente machista. Por outro lado, aos trancos e barrancos, conquistas antigas como o direito de votar e, ao longo do tempo, a vitória de poder participar de atividades antes exclusivamente reservadas a homens, evidentemente são indicativos de que a mulher vem adquirindo seus direitos e galgando sua escalada de igualdade em todos os sentidos.
A discriminação e perseguição ao sexo feminino é tão antiga quanto o Gênesis, pois é lá onde se lê que Eva comeu primeiramente do fruto proibido oferecido pela serpente, para depois oferecer a Adão, imputando, portanto, à primeira mulher a culpa do “pecado original” e a derrocada da humanidade. O conceito inicial de submissão feminina também se encontra no livro primeiro da velha escritura, que narra a criação da mulher a partir de uma costela do homem. São mitos milenares que alcançaram ainda com vigor os dias de hoje, embora o bom senso entenda que sejam conceitos anacrônicos e absurdos.
Voltando ao caso Yanny Brena, dentre tantos outros semelhantes na crônica policial, somos induzidos a meditar na estreita fronteira entre amor e ódio, que ambos parecem andar de mãos dadas, desde que mundo é mundo. Somos também induzidos a refletir no conceito tão volátil da felicidade, essa abstração assaz almejada por todos nós. É o caso, pois, de se perguntar: a felicidade, em sua plenitude, não estaria na existência de uma pessoa ainda tão jovem, médica, empresária, em elevada posição social, iniciando uma carreira de sucesso na política, e cheia de vida, saúde e beleza? Até parece que não, pois tudo isso foi interrompido barbaramente, e para sempre, pelas mãos de um jovem também cheio de vida e longa caminhada pela frente, entretanto, cheio de ódio, que após matar a companheira tirou a própria vida, perpetrando um caso monstruoso, de tantos que já têm acontecido. Em resumo: ou a felicidade plena não existe, ou se existe, muitos a repelem e se infelicitam por si mesmos. A propósito da dualidade amor e ódio, encerro esta crônica com o dizer do escritor Thomas Merton: “A distância mais longa é aquela entre a cabeça e o coração”.
Pedro Paulo Paulino